Derrotar Bolsonaro no primeiro turno

Artigo – Hudson Carvalho Para os segmentos políticos e sociais antiautoritários, faz-se necessário entender que a próxima eleição presidencial clamará pela urgência de salvação da democracia brasileira, em detrimento da natural e salutar disputa de poder entre grupos antagônicos. O que estará em foco, fundamentalmente, será salvaguardar a nossa democracia, vilipendiada e molestada, constantemente, por…

Artigo – Hudson Carvalho

Para os segmentos políticos e sociais antiautoritários, faz-se necessário entender que a próxima eleição presidencial clamará pela urgência de salvação da democracia brasileira, em detrimento da natural e salutar disputa de poder entre grupos antagônicos. O que estará em foco, fundamentalmente, será salvaguardar a nossa democracia, vilipendiada e molestada, constantemente, por Bolsonaro. O substantivo será livrar o Brasil de Bolsonaro e de tudo o que ele significa, tornando o demais secundário. Se Bolsonaro se reeleger, a democracia nativa correrá sérios perigos de desvigorar e até mesmo de fenecer.

Recente pesquisa do Ipec traz alvíssaras: o ensejo do presidente ser derrotado já no primeiro turno – Lula com 49% e Bolsonaro, 23%. Realisticamente, não devemos contar com isso, mas sem desprezar essa possibilidade para efeito de estratégias. Bolsonaro amarga o seu pior momento, podendo, porém, se beneficiar de conjuntura de fatores que se horizontalizam – expansão da vacinação, crescimento da economia, prolongamento do auxílio emergencial e incremento do Bolsa Família. Em contrapartida, a capacidade do presidente de errar, de fazer bobagens, de escandalizar, é imensa. Bolsonaro afigura-se epítome do ressentimento desencapado, da deformação moral e da desnutrição mental. Só um dementado jacta-se de retirar máscaras de criancinhas assombradas.

A esta altura, as pesquisas significam pouco e o quadro de candidatos ainda é impreciso. Particularmente, prefiro conjecturar sobre eleições somente durante os processos oficiais, com os postulantes sagrados em convenções. Evito perder tempo com as especulações prematuras afeitas à burguesia iluminista, como os joaquins barbosas, moros e hucks da vida, que, no frigir dos ovos, afortunadamente, nunca se consolidam. Desfulanizando, outsiders não dão certo em política. O desafio é muito pesado para escoteiros.

Por ora, as pesquisas insinuam uma polarização entre Bolsonaro e Lula. Essa é a tendência, contudo não há certezas em eleições. Tudo indica que, além de Bolsonaro e Lula, no mínimo dois outros pretendentes de peso político se habilitarão ao pleito – Ciro Gomes e um nome do PSDB (João Doria, Eduardo Leite e Tasso Jereissati disputam as prévias). E, provavelmente, haverá mais alguém. A despeito do número de candidatos, aparentemente, todos expressarão oposição a Bolsonaro. Para defender a nossa democracia, vencê-lo far-se-á imperativo, seja com quem for. Enfatizando: seja com quem for. E quanto mais eloquente a vitória, melhor, para inibir contingências golpistas.

Se houver condições de sobrepujar o presidente no primeiro turno, como sugestiona o levantamento do Ipec, seria o ideal; nem que para isso algumas candidaturas fossem retiradas, na reta final do pleito, em favor daquela que ostentasse premissas mais favoráveis para suplantar o abominável presidente. Os candidatos antibolsonaristas disporão da campanha eleitoral para expor as suas propostas e convencer a população. Em uma eleição de excepcionalidades, no entanto, os que não cativarem o eleitorado, durante o percurso, devem considerar a hipótese de deixar a corrida em prol do postulante com melhores viabilidades.
Ou seja, ilustrando: se a dez dias do pleito no primeiro turno, Bolsonaro e um candidato X concentrarem cerca de 75% das intenções de voto ou se houver um antibolsonarista com mais de 40%, os demais renunciariam em benefício do contrastante, objetivando liquidar logo a parada e evitar riscos desnecessários. Mesmo que uma explícita e confortável projeção indique a debacle de Bolsonaro em um ocasional segundo turno, o apropriado seria tombá-lo no primeiro. Se Bolsonaro entrar no segundo turno tecnicamente perdido, poderá animar um ambiente de convulsão social, delineando um putsch.

É óbvio que essa expectativa de abnegação se reveste de ineditismo e de ares utópicos. Dada a tensão que Bolsonaro representa, entretanto, a engenharia de sacrifícios não deve ser negligenciada. Nem todos os votos dos sacrificados, por suposto, iriam para o candidato oponente a Bolsonaro, todavia a maioria teria essa inclinação e alguns engordariam o contingente de nulos, o que também não seria mau. Os eventuais eleitores de Ciro e Lula, por exemplo, fariam a migração recíproca quase que integralmente. No mais, o fantasmagórico imaginário de uma “venezuelização” à esquerda foi desmoralizado pelo governo Bolsonaro. Sabemos em que flanco as Forças Armadas perfilam-se. Com os militares que temos, não há a menor hipótese de uma “venezuelização” à esquerda. Por um lado, ainda bem. Por outro lado, a luta crucial é para que uma esdrúxula e antidemocrática “venezuelização” não se concretize à direita.

Sempre fui a favor do instituto da reeleição. Em tese, um bom regente merece continuidade. No Brasil, infelizmente, a reeleição tem sido uma desgraça para o país. Os governantes só agem em função dela, que se transformou em um fim em si e não em uma consequência de trabalho frutuoso. Urge acabar com a reeleição; pelo menos, para a Presidência da República. Talvez, seja o momento de os candidatos se comprometerem com isso, sobretudo se houver um pacto contra Bolsonaro. Acho, inclusive, que quem pregar o fim da norma da reeleição aglutinará bastante simpatizantes entre os setores médios informados.

Há animadoras perspectivas eleitorais de nos alforriarmos de Bolsonaro. Basta as elites democráticas compreenderem a verdadeira natureza do jogo e agirem com grandeza.

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