Segurança Pública no RJ: alerta a Rodrigo Neves, Cláudio Castro, Marcelo Freixo, Clarissa Garotinho e André Ceciliano

* Paulo Baía. A pauta da segurança pública ficou silenciada no debate dos candidatos ao governo do RJ na noite de domingo, dia 07/08. Mas segurança pública é indissociável de qualquer outra pauta no estado do Rio de Janeiro. Vou transcrever o texto do amigo e especialista Cel. PMERJ Antônio Carlos de Carballo Blanco como…

* Paulo Baía.

A pauta da segurança pública ficou silenciada no debate dos candidatos ao governo do RJ na noite de domingo, dia 07/08.

Mas segurança pública é indissociável de qualquer outra pauta no estado do Rio de Janeiro.

Vou transcrever o texto do amigo e especialista Cel. PMERJ Antônio Carlos de Carballo Blanco como ponto de partida do necessário debate e tomada de decisões do novo governador e do novo senador pelo estado do RJ.

Seguem alguns apontamentos do professor Carballo Blanco, começando pela terceira tese:

O Cel Antonio Carlos de Carballo Blanco tem  “12 teses fundamentais para desenvolver e transformar a segurança pública no estado do Rio de Janeiro”. Carballo é coronel da PMERJ, professor e especialista, mais do que tudo um velho e bom parceiro nas jornadas pela cidadania plena no estado do RJ.

” Tese nº 3 – O TEMPO FUTURO DA JUSTIÇA CRIMINAL E DA SEGURANÇA PÚBLICA DEVE PRIMAR PELO DESENVOLVIMENTO E CONSOLIDAÇÃO, NO TEMPO PRESENTE, DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE PREVENÇÃO SOCIAL.

“O grave quadro das desigualdades e injustiças sociais que, historicamente, assola a sociedade brasileira, exige do Estado a adoção de políticas públicas estruturantes imediatas, de serviços básicos e assistência social que repercutirão, numa perspectiva de impacto de médio e longo prazos, nos indicadores futuros de crime e de violência. Tais políticas públicas, de cunho socialmente preventivo, revestem-se também de propriedades econômicas potencialmente produtivas. Em outras palavras, são medidas e ações governamentais de prevenção social do crime e da violência, que guardam em si e entre si as capacidades pedagógicas e metodológicas orientadas ao comportamento crítico e responsável do indivíduo, preparando-o e condicionando-o para o desenvolvimento de um ser humano solidário e socialmente produtivo. ”

Não obstante o reconhecimento científico, criminológico, que confere à prática do crime, e a conduta criminosa dela decorrente, o caráter de fenômeno social, de natureza e matriz interpessoal e comunitária, no âmbito do processo histórico e cultural brasileiro, raríssimas foram as iniciativas governamentais que trataram esse doloroso problema social com políticas públicas estruturais e estruturantes.

Via de regra, o crime e a violência sempre foram encarados pelo Estado brasileiro, sob um olhar míope, como uma patologia, um mal que deve ser extirpado. Não por acaso, essa visão deturpada do Estado brasileiro, enviesada, que desconsidera as razões etiológicas do fenômeno social delitivo, e tão somente promove ações de cunho repressivo, mormente recheadas de iniciativas violentas, arbitrárias e abusivas, sem enfrentar o desafio regular e permanente de compreender a natureza do fenômeno criminal e sua etiologia, conduz a um ciclo vicioso de velhas práticas policiais desqualificadas onde predomina, em nome do imediatismo ilusório de uma resposta política falaciosa, a barbárie, combustível que reproduz o medo e a insegurança pública, a injustiça e a desigualdade social.

No campo da justiça criminal, por sua vez, no que tange à aplicação da pena de encarceramento, ainda se faz presente, com bastante contundência e pouca margem e coragem crítica ao modelo clássico e neoclássico de prevenção do delito, a crença, no caso brasileiro, apropriada indevidamente, de forma exacerbada, por agentes oportunistas do poder político, de que o aumento da pena e/ou a sua efetiva e célere aplicação constituem medidas suficientes para dissuadir a prática criminosa. Aqui não se faz uma crítica à pena em si e sua função social, mas sim ao modelo de justiça penal brasileiro que desconsidera, via de regra, outras medidas compensatórias de retribuição com vistas à reparação de dano que não o encarceramento. 

Regra geral, para fins de elaboração e desenvolvimento de políticas públicas de enfrentamento ao crime e à violência, o Estado brasileiro considera essas práticas delituosas como sendo um mero enfrentamento entre o infrator e o Estado. Desconsidera, pois, a etiologia do fenômeno criminal, o perfil do infrator (sua origem, história de vida familiar, perfil psicológico, vivências e riscos pessoais e sociais etc), a dinâmica da prática delituosa em si (características físicas ambientais, modus operandi etc), o próprio padrão de funcionamento dos sistemas de justiça criminal e segurança pública, o perfil da vítima etc. Investigar e conhecer essas razões etiológicas são, portanto, as bases que configuram a moderna criminologia e servem de importante subsídio para a elaboração de políticas públicas estruturantes de prevenção e de repressão qualificada do delito.

É nesse sentido que o tempo futuro da justiça criminal e da segurança pública deve primar pelo desenvolvimento e a consolidação, no tempo presente, de políticas públicas estruturantes de prevenção social do delito. Insistir com a velha receita da política do encarceramento, socialmente improdutivo, verdadeiras “universidades do crime”, com regras e dinâmicas relacionais de lealdade à facção da vez e instalações impróprias e insalubres à ressocialização e reintegração do detento à sociedade, aliada com a recente e desastrosa política armamentista levada a efeito pelo atual governo federal, além da prática policial repressiva desqualificada, com custo social elevadíssimo e que tem resultado, ao longo dos anos, na morte criminosa e estúpida de policiais e civis, representa, em última instância, além de contratar, regularmente, crime e violência futura, a perpetuação do modelo de reprodução do padrão histórico de injustiça e desigualdade social, fatores críticos que atravancam, sobremaneira, o desenvolvimento humano, social e econômico do Brasil e, em particular, o desenvolvimento do estado do Rio de Janeiro.    

Nesse diapasão, além das indispensáveis reformas estruturais nos sistemas de justiça criminal e de segurança pública, das eventuais intervenções no desenho arquitetônico e urbanístico das cidades, tudo com vistas a um efetivo controle do fenômeno criminal, dentro de um padrão minimamente civilizado, faz-se necessário também, imprescindível para o desenvolvimento de políticas públicas estruturantes de prevenção social, socialmente solidárias e sustentáveis, a adoção de medidas de prevenção primária, secundária e terciária, medidas estas que propiciarão, a médio e longo prazo, as capacidades cognitivas, pedagógicas e metodológicas ensejadoras de um comportamento crítico e responsável por parte indivíduo, preparando-o e condicionando-o civicamente para o desenvolvimento de um ser humano solidário e socialmente produtivo.

No Brasil, em face do profundo abismo social que separa o asfalto da favela, aliado a uma generosa dose de impunidade, a polícia e a justiça não são suficientes para enfrentar o desafio permanente da segurança pública e controlar, com padrões mínimos de civilidade, o fenômeno criminal. É preciso, pois, para além do fundamental esforço de reformar e aperfeiçoar as instituições de justiça criminal e de segurança pública, consolidar um modelo de prevenção social do delito, que seja capaz de projetar, a médio e longo prazo, o impacto positivo proporcionado pelas condicionantes fundamentais de sociabilidade mitigadoras e redutoras dos riscos pessoais e sociais dos indivíduos que se encontram, hoje, em condição de vulnerabilidade.  Contudo, esses esforços somente serão efetivos com a participação de todas as forças vivas da sociedade, a concertação de todas as forças político-partidárias, nos três poderes constituídos e nos três níveis de governo.

Em suma, além de enfrentar o crime e a violência a partir da compreensão das razões etiológicas do fenômeno delitivo, e perseguindo sempre a sua causa finalística que é a obtenção de lucro através de operações estruturadas de lavagem de dinheiro, é preciso também reformar e aperfeiçoar as polícias, os mecanismos de controle externo da atividade policial, tudo em proveito de uma nova força policial cidadã. Entretanto, sem apostar no futuro das crianças e dos adolescentes de hoje, particularmente àqueles que estão em situação de vulnerabilidade, com destacado risco pessoal e social, todos os investimentos realizados na justiça criminal e na segurança pública tenderão a esvair-se sem qualquer efeito prático para a redução do medo e da insegurança. É preciso investir, hoje, nos jovens para que sejam resilientes e estejam preparados para os desafios que estão por vir. 

Saúde, educação, esporte, cultura, lazer, inovação, trabalho, geração de renda etc, são medidas de prevenção primária de primeira magnitude. A articulação institucional de ações integradas entre estado e município, para o bom êxito dessas políticas públicas estruturantes de prevenção social do crime e da violência é de vital importância para a redução do crime e da violência. Por outro lado, complementarmente, uma nova polícia cidadã, moderna e a valorizada, com práticas operacionais de proximidade-comunitária e resolução pacifica de conflitos, constituirá o principal ativo da cidadania e da democracia e também importante vetor de medidas de prevenção secundária, medidas essas concorrentes e determinantes para o esforço comum de mitigação e redução do crime e da violência. Por fim, porém não menos importante, a adoção de penas alternativas ao encarceramento, para os apenados de pouca periculosidade, conjugadas com outras medidas de prevenção terciária, tendo sempre em vista a ressocialização e reintegração produtiva à sociedade do egresso do sistema penal, constitui o terceiro e fundamental esforço de prevenção do delito no âmbito de uma efetiva política pública de segurança pública.”

Esse é o texto inicial de uma série com foco na visão apurada de Antonio Carlos Carballo Blanco, coronel da reserva da Polícia Militar do Rio de Janeiro.

* Sociólogo, cientista político, técnico em estatística e professor da UFRJ

Deixe uma resposta

Mais recentes

Blog at WordPress.com.

Descubra mais sobre Agenda do Poder

Assine agora mesmo para continuar lendo e ter acesso ao arquivo completo.

Continue reading